Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil
13/03/2023 – 08:24:34
Luiz Felipe
Em ritmo bem perdido e totalmente fora do que pedem milhões de professores por todo o país, o Ministro da Educação, Camilo Santana acabou metendo os pés pelas mãos ao instituir uma consulta pública sobre o Novo Ensino Médio, que de novo não tem absolutamente nada, é apenas retrocesso e aval para a desigualdade social.
Publicada em 8 de março, a portaria 399 do Ministério da Educação, a portaria trata de avaliação e reestruturação da política nacional de Ensino Médio, quando na verdade, o que deveria acontecer, é a revogação da portaria 521/2021 que instituiu o cronograma nacional de implementação do novo ensino médio.
O Novo Ensino Médio, que na verdade foi o pão que o diabo amassou para os professores, especialmente no estado do Paraná com Renato Feder sendo o próprio diabo em si, é nada mais que uma falácia pintada de novos projetos educacionais e que o novo Ministro da Educação parece ter levado para dentro do MEC.
Aprovada durante o governo de Michel Temer, a reforma do ensino médio deu uma verdadeira rasteira na educação brasileira, sobretudo em municípios mais pobres, onde a estrutura das escolas e colégios é totalmente precária. Para se ter ideia, em Guarapuava, por exemplo, alguns colégios sofrem com a falta de laboratórios e os alunos acabam tendo de se empilhar nos colégios sem a menor condição de trabalho, sem contar todo o estresse para os professores.
O novo Ensino Médio também instituiu o aumento de carga horária para os estudantes e os itinerários formativos, que nada mais são do que um conjunto de disciplinas, projetos, oficinas, núcleos de estudo, entre outras situações de trabalho, que os estudantes podem escolher no ensino médio. Na teoria é maravilhoso, porque dá a entender que se trata de uma educação muito mais inclusiva, tecnológica, emancipadora; a propaganda foi muito bem-feita. Mas somente o fato de a proposta ter sido construída sem o menor diálogo com os trabalhadores da educação, estudantes e comunidade de forma geral, já demonstra que o interesse não é atender as demandas de professores e estudantes, mas atender ao que gente totalmente despreparada pensa que sabe sobre educação. O maior problema desse país é que independente de governo, quem comanda a educação nunca botou o pé numa sala de aula da educação básica. Fernando Haddad é profundo conhecedor da educação e talvez seja a exceção ao montante de ministros incompetentes que comandaram a pasta até hoje.
A negligência de Jair Bolsonaro enquanto presidente e de sua meia dúzia de ministros de educação, com mentalidade totalmente retrógrada e quase nazista, também ajudaram a afundar a educação brasileira. A falta de coordenação e o projeto de terceirização e da tentativa de implantação da aberração chamada de ensino domiciliar, fizeram com que cada estado da federação agisse de maneira independente, criando mecanismos terroristas, declarando guerra contra os professores e acabando aos poucos com a educação pública de qualidade.
Outro grande problema que o novo ensino médio também revela é a própria formação dos professores, um processo que passou pelo momento trágico em que o governo enfiou goela abaixo uma BNCC totalmente sem pé nem cabeça. Camilo não está preocupado em como melhorar as escolas do país, mas sim em como adaptar cada realidade, isto é, para a escola de melhor estrutura, o cardápio (fala do ministro) será mais amplo, maior, enquanto que para a escola mais periférica, com menor estrutura teria que passar por uma adaptação. É ridículo, mas é a fala do Ministro da Educação.
Uma mudança significativa também ocorrerá no Exame Nacional do Ensino Médio, que em tese também tem uma proposta boa, uma vez que o exame passaria a ser aplicado com duas etapas, sendo uma delas mais correspondente à matriz que o aluno escolheu. Mas a prática tende a ser bem diferente, justamente pelo modo com que a matriz curricular está para ser distribuída. Em linhas gerais, o ENEM ainda é o único exame de ingresso em instituições de ensino superior que realmente consegue fazer uma avaliação cirúrgica do ensino médio, pois os vestibulares – além de ultrapassados – não avaliam absolutamente nada. Basta ver o vestibular da Unicentro e de outras estaduais; é desonesto com os estudantes.
Outra baboseira estipulada pelo Novo Ensino Médio o “projeto da vida”, que é um componente transversal ofertado nas escolas para ajudar os estudantes a entenderem suas aspirações profissionais, o que por si só não é tão ruim, mas acabou engolindo componentes importantes da grade como Arte e Sociologia, além de sobrecarregar os professores já ignorados pelo estado. E voltamos novamente à estrutura precária das escolas, porque não há unidades preparadas para receber o novo ensino médio.
Para desenhar melhor a situação, vamos ao exemplo prático. No itinerário formativo, o estudante pode escolher, por exemplo, entre matemática e linguagens. Então, em vez de uma turma iniciar o dia com uma aula de matemática às 07h30 da manhã, ela se divide em dois grupos, o que escolheu matemática e o que escolheu as ciências humanas, por exemplo; algo que obriga que em vez de uma única sala para uma mesma turma, a escola tenha mais uma sala para abrigar a metade daquela turma. Desafio você, caro leitor, a apontar uma escola da rede pública que tenha estrutura para isso. Me traga provas e lhe pago um engradado de cerveja!
Um dos pontos mais críticos, talvez, diz respeito à evasão. Pois, com o aumento da carga horária – que deve chegar até 7h (cursos integrais) em 2024, não é nada atrativo, porque mais uma vez esbarra na desigualdade social e péssima distribuição de renda. Muitos estudantes no ensino médio já exercem atividade profissional para ajudar em casa e neste caso fica mais difícil conciliar a escola e um emprego. Em um mundo ideal esse estudante deveria apenas focar suas energias e tempo na escola, mas estamos longe do ideal, portanto é uma falácia e falta de empatia não considerar esses aspectos, além de ser uma tremenda burrice. É o primeiro passo para desestimular estudantes mais pobres a frequentarem o ensino superior; o que é inaceitável, covarde e criminoso, dado a forma como foi enfiado goela abaixo da sociedade, que em partes aceitou passivamente.
Com isso, a tendência do índice de evasão escolar é de aumentar cada vez mais. No caso do Paraná, por ocasião de política implantada pelo ex-secretário de Educação, Renato Feder, o Governo Ratinho Jr. resolveu punir diretores por falta dos alunos com um novo sistema de frequência chamado de BI. Neste sistema, a frequência mínima é de 80%, enquanto que a legislação federal estipula a carga mínima de 70% da frequência obrigatória para ser aprovado. Não bastasse isso, nos casos em que a escola não atinja o percentual exigido pela SEED-PR, o diretor ou diretora é responsabilizado e destituído do cargo. Recentemente, o governo estadual destituiu a direção do Colégio Visconde de Guarapuava por esses exatos motivos, desrespeitando a comunidade escolar que escolheu seus diretores de modo democrático.
O que fica claro neste momento, é que em nome da governabilidade, Lula acabou rifando o mais importante Ministério do governo federal para alguém completamente despreparado, que quer atender aos interesses do empresariado que enxerga a educação como negócio lucrativo. E o pior é que não é a primeira bola fora do governo; o tom amigável de consulta pública nada mais é do que querer biscoitar, isto é, pedir aplauso por fingir importar-se com a opinião da sociedade. Essa consulta pública é uma arapuca e muita gente vai cair, achando que estamos avançando. Mas enquanto não houver a revogação total dessa selvageria de novo ensino médio, tudo o que sair do governo é igual aos cretinos anteriores. Uma nova educação só poderá começar com o fim da barbárie chamada de novo ensino médio. A escola pública tem um papel fundamental no combate à desigualdade social e o governo tem a obrigação e responsabilidade de dar o mínimo de condições de trabalho para os docentes. Nossos professores estão sendo açoitados todos os dias e obrigados virar noites trabalhando, sob ameaças políticas de políticos cretinos.
• Historiador •
Formado pela Universidade Estadual do Centro-Oeste – Unicentro;
Professor de História e Sociologia;
Pesquisador.
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